Apocalypso, não!



Uma estranha formação de nuvens foi filmada pairando nos céus de Moscou. Como uma aliança de luz colossal, ou um vigilante olho sem pálpebra, dependendo do romantismo do observador. Corta para a minha placa de “Eu já sabia.”

Não é de hoje que sustento seja o apocalipse uma parceria entre duas entidades poderosíssimas: a saber, Deus e os Extraterrestres. Há muito que o Criador anda desgostoso com os humanos. Descumpriram o pacto de não-agressão firmado depois do dilúvio (tratando posteriormente a aliança representativa do acordo como um mero fenômeno óptico chamado arco-íris, e tendo coragem de chamar o episódio de “plágio” da Epopéia de Gilgamesh), consumiram demais, produziram de menos e até no petróleo que escondera com tanto esmero tinham dado para mexer. Sem falar no que haviam feito com o guri, que nunca mais fora o mesmo.

Foi difícil a decisão do despejo. Tanto que Deus ainda reluta em levá-la a cabo. Seus assessores concordaram que seria mais adequado conceder a Terra aos aliens, que, entre outros inúmeros benefícios, pagariam em dia, não renegariam o valor de algumas invenções humanas realmente úteis (como a escada rolante e a privada), não destruiriam os recursos naturais e produziriam patrimônios históricos muito melhores que “aquelas horríveis cabeças em Páscoa”.

— Sei não... — disse Deus, com eloqüência.

A prova de que o Todo-Poderoso quer nos dar uma segunda chance para mostrarmos que ainda podemos ser bons inquilinos são os sinais, como esse da Rússia. Cada círculo em plantação de milho, cada imagem de santo que chora e cada bezerro bicéfalo que nasce são avisos contratuais divinos, como se Deus estivesse nos dizendo, mãozinha estendida:

— Paguem os 21 séculos de aluguel!

E olha que Ele ainda tomou nossa convenção ocidental do tempo para contar os atrasados. Mateus, aliás, é tido como o mais famoso cobrador de impostos da Bíblia, quando esse título na verdade pertence a Jesus. Mandar o próprio filho inspecionar a administração do legado paterno foi certamente uma experiência traumática, e imagino que Deus já deva pensar com aflição em quem dará a ordem do despejo, caso chegue a executá-la. Poderia terceirizar a empreitada, e quando os humanos dessem por si, haveria tratores gigantescos aplainando o Pão de Açúcar.

— Mas o que é isso?!

— Desculpem. Ele disse que os avisou.

— Como? Na Bíblia falava que haveria toda uma Guerra ideológica antes!

— Ele também disse que enviou uma errata da Bíblia numa plantação de milho no Ceará, mas parece que a encomenda de pamonha era grande e vocês não tiveram tempo para ler.

Não podemos negar que foi uma desconcertante ironia, a de botar uma auréola sobre a Rússia. Logo a Rússia, o berço de um sistema que, em nome de ideais igualitários, erigiu um regime ainda mais opressor. O Comunismo Soviético é o segundo maior argumento dos assessores de Deus para o apocalipse, que não será uma aniquilação, afinal, e sim uma transferência de terras. O primeiro todo mundo sabe qual é. A banda Calypso, é claro.

Até imagino como Douglas Adams chamaria uma organização humana rebelde, caso Deus nos pusesse realmente no olho do Universo, junto com toda a nossa tralha.

“Movimento dos sem Terra”.

E nós, como o Seu Madruga, continuamos saltando pela janela.



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